terça-feira, 6 de dezembro de 2005

Ultimamente me deparei com alguns poemas meus onde os títulos nos remetem a lugares que sabemos existir, mas aos quais nunca fomos, nunca chegamos realmente a conhecer em nossas vidas, ficando apenas a certeza de sua existência, apesar de nunca os ter vistos nem visitados. Na realidade, títulos que procuram explicar nossa própria existência, onde muitas vezes acreditamos em coisas que não vemos, não enxergamos, não temos como tocar, mas que sentimos e sabemos que nos permeia a alma, o espírito. Sim, você sabe que está amando, mas não pode tocar nesse sentimento, como se fosse na cozinha buscar um copo de leite, ou um pedaço de torta. Você sabe que ele existe, ele está ao seu redor, permeia sua pele de sensações e provocações hormonais, rodeia seu espírito como uma aura invisível de poder e força. Sim, é uma abstração que não faz parte desse mundo de corpos, massas e concretos.

Escrevi três poemas onde os títulos, por si só, procuram expressar essa faceta de nossa existência. São lugares que existem, estão lá, a milhares de quilômetros de distância, e eu sei que existem, mas que nunca fui lá, nunca andei por lá. E mesmo sabendo que nunca vi tais lugares, eu acredito que eles existam e os imagino e os sinto em meus pensamentos. Isso é um tipo de situação abstracional que podemos comparar com os sentimentos, as emoções. Amor, raiva, saudade, compreensão, paixão, fé. Como não acreditar em coisas que nos invadem de repente e se alojam dentro de nós muitas vezes até à nossa revelia? Mesmo que não se queira acreditar, isso não mudará o fato dos lugares existirem. Três poemas meus tem títulos assim: Chuva sobre Andaluzia, Os ventos de Kandahar e o mais recente, As areias de Corsica. Todos os três falam de sentimentos, amores, devoção a quem você ama, abstrações que você não enxerga, mas que sente. Assim como os lugares dos títulos. Você não os vê, nunca os viu, mas sabe que eles existem, e podem de alguma forma alterar o teu estado de espírito.


Chuva sobre Andaluzia

A maré trouxe para dentro de meu coração
Um bravo oceano de calmarias
Gotas de chuva e pés descalços
Criando inquietas ondas de revoluções
O céu lançou-me num abismo
Onde o vento limpa minha face
De todos os males do mundo
Chorei com um sorriso, me perdi num abraço
Dormi em afagos, afoguei-me em carinhos
Encontrei clarões sutis
Na escuridão que te envolvia
A tempestade nos atravessaria.


Os ventos de Kandahar

O deserto cruel apaga tuas pegadas
Evapora de teus poros
O suor de tuas conquistas
Deixando apenas o calor insistente
De tuas lembranças remotas
Caminhar numa jornada de amores perdidos
Contar os grãos de areia
Imaginar o mar, amar o distante
Guardado dentro do pensamento
E mesmo assim, diante de imensa distância
Enxugar tua lágrima, abraçar-te
Afogar tuas tristezas, guardar teu sono
E manter acesos os clarões sutis
Na escuridão que agora nos envolvia.


As areias de Corsica

Você é uma bênção. Um elo cativante.
A raiz das conexões incessantes.
O salto nos ventos dos horizontes.
Uma ilha ensolarada acima do Meridiano.
Você está na velocidade dos meus pensamentos
na dança descalça dos meus passos na praia
na música aprisionada em minha mente
no meus pés molhados e no meu olhar pensativo.
Você é uma sublimação. Uma essência constante.
Você criou minhas lembranças mais fortes
gerou meus versos mais lindos e corajosos
amanheceu meus dias mais impressionantes.
Você é uma poesia. Uma tradução divina.
Transmutação de sentidos, levitando meu
corpo e meu espírito para além do limite
onde perco o meu senso de gravidade.

 

Ulisses Góes

quinta-feira, 1 de dezembro de 2005

Cada período de nossas vidas constitui-se numa série de ciclos entrelaçados, onde você realmente nunca sabe onde terminou um e onde o outro definitivamente teve início. Gostar das pessoas, amar umas, afastar-se de outras. Confesso que não fico feliz em ter determinadas certezas, como a hora que o dia termina, para dar início a um novo dia, ou a programação da tv, ou onde o sol nasce e se poe. Claro que que pra essas certezas existem pequenas e sutis variações, pois o sol nunca nasce sempre no mesmo ponto do horizonte, dependendo sempre da estação do ano em que nos encontramos. Mas esses ciclos que nos invadem a vida, onde você realmente não encontra o ponto determinante, são pequenos tormentos que algumas vezes me tomam de assalto o espírito. Que dia exatamente eu te conheci? Como nossa amizade realmente começou? Como eu fui me aproximando de você aos poucos, e de que maneira? Como chegamos a tudo isso, nesse ponto onde nos encontramos no momento? Ninguém lembra mesmo do princípio de tudo.

A impressão que eu tenho é que conhecemos as pessoas como se já conhecessemos antes, e tudo foi simplesmente um emaranhado de reencontros, de reaparições, quando na verdade, tudo teve um início certo, único, próprio. Isso que dá ficar pela madrugada escrevendo poesias, pensando nas pessoas que você ama, sentindo uma saudade saudável aflorando no peito. Mas as pessoas te influenciam de alguma maneira, e vice-versa. E assim vamos seguindo nossas vidas, onde as pessoas aparecem e tomam conta de você de forma mágica, onde elas te invadem e fazem você invadir elas. Onde você ensina o que sabe e aprende o que nem imagina. A vida é uma troca equivalente, uma alquimia reinante, uma transmutação de sentimentos e emoções. Só não escrevo mais sobre isso agora porque estou faminto e vou comer um pedaço de bolo de chocolate. Mas minhas palavras continuam logo abaixo, criadas por influências diversas, principalmente das pessoas que passam em sua vida e te marcam de alguma maneira. E por causa delas, eu amo sem limites, e por causa delas, eu sou capaz de desarmar bombas atômicas, antes que o mundo se exploda completamente.

Versos alquímicos

Eu não tenho para onde correr sem teus passos
Nessas ruas sem placas de sinalização
Meus caminhos são misteriosos e tortuosos
forrados de grama verde e rodeado de asfalto
Não tenho medo de não ser amado
Não tenho medo de colesterol nem de muros altos

Mas tenho medo de não ver teus passos ao meu lado
ou de não ouvir mais tua voz mágica ao meu redor
Sua face linda soltando sorrisos adocicados
Pois tudo que se move em minha vida
é por causa de você

Andar de trem acompanhando o mundo lá fora
Afogar-se na multidão de um show monumental
Encarar seu olhar e sua risada ao mesmo tempo
Dormir e sonhar com teus abraços macios
Pois tudo que se movimenta em torno de mim
é por causa de você

Não tenho para onde voar sem tuas asas
Nesse céu de bombas suicidas e ameaças terroristas
Minhas jornadas são poéticas e fantásticas
onde minha vida é transmutada em Alquimia
de palavras, de vontades, de versos, de desejos

Se eu te encontrar um dia, serei mais feliz
Terei mais coragem de realizar meus sonhos
e não pensarei duas vezes antes de nos salvar
Tenha certeza de que sempre te salvarei
Nem que tenha que desarmar uma bomba atômica
antes que o mundo inteiro se acabe numa explosão.

Ulisses Góes // dezembro 2005
 
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